sábado, 29 de dezembro de 2012

PAULO ROCHA 1935 -2012 / MUDAR DE VIDA - 1966

 Naquela altura ainda havia muita pesca e havia várias companhas. Era um processo que envolvia 300 pessoas para aí. Os homens dos bois dormiam aqui muitas vezes deixavam os currais perto dos barcos para se de repente o mar ficasse muito mau eles serviam para puxar os barcos para longe do mar. Isto era duma escala enorme. (...) Quando eu tinha 5 anos ou dez havia talvez 3, 4 companhas. A certa altura já só havia uma. Entretanto anunciou-se que a última ia acabar.
Era preciso filmar.
Inventei uma história, adaptável ao contexto e portanto eu meti todas as cunhas na região e na minha família para tentar aguentar mais um ano a companha para ainda ser filmado. (...)


Eu tenho imensos remorsos ao longo da minha vida por não ter sido fiel às experiências das pessoas que viveram em frente a mim e que eu podia ter salvado do esquecimento e da morte, porque entregaram-me num momento de confiança algum aspecto de si próprio e isso eu tenho de dezenas ou centenas de pessoas e de lugares árvores que morreram, campos e ruas que foram destruídos, pessoas que eu conhecia e o que eles tinham de único e frágil desapareceu. Não sou suficientemente enérgico para estar todos os dias a filmar.

Sou um bocadinho como era o Camões em Macau: era curador dos defuntos e ausentes.
Eu acho que em parte os meus filmes são isso.
É nisso preservei alguma memória de família e amigos... e da praia.
E ao longo da minha vida preservei em cada filme isso.
Paulo Rocha